INDICAÇÕES
[HQ] ASTERIOS POLYP - DAVID MAZZUCCHELLI
Talvez o trabalho mais conhecido do designer, professor e quadrinhista David Mazzucchelli seja Batman - Ano 1. Para a hq do homem morcego, Mazzucchelli proveu as artes da saga escrita por Frank Miller sobre o início de carreira do vigilante de Gotham que, além de elogiada na época, veio a inspirar mais diretamente o último filme do super-herói.
Mesmo com o sucesso, David, no entanto, não parece ter se afeiçoado tanto da carreira quadrinhística: após a década de 1980, quando trabalhou para as grandes editoras, Mazzucchelli passaria os próximos 20 anos dedicando seu trabalho mais a obras autorais que, de fato, se tornaram cada vez mais espaçadas no tempo.
Sua última publicação, com efeito, é de 2009 e desde então não tivemos um novo trabalho do autor. Não obstante, se qualidade é sempre melhor que qualidade, então esse último trabalho tem o mérito de nos deixar ocupados até hoje extasiados com sua narrativa visual e pensativos com sua profundidade. Essa obra não é nada menos que Asterios Polyp (2011).
No enredo, Asterios Polyp, um arrogante professor de arquitetura, tem sua casa destruída por um incêndio e, a partir desse desastre pessoal, o vemos repensar e reconstruir sua vida - como um ajudante de mecânico numa minúscula cidade da América profunda - pelo que é importante: as pessoas em sua vida.
No desenvolvimento, então, nos encontramos com um antes pedante Asterios que se vê como um homem quebrado, buscando em sua memória e seus sentimentos a razão de sua vida através dos relacionamentos com sua família, seu trabalho e sua ex-esposa, Hana.
Para além do brilho da história - que tem sobre-tons de autoficção já que Mazzucchelli também é professor universitário na área de design -, a metalinguagem da forma como essa história é contada, com a vivacidade das cores, o jogo das formas, dos estilos, a (não)lineraridade visual e as referências a história da arte, demonstra como as histórias em quadrinhos podem ser uma forma de arte tão rica e complexa como as mais legitimas e prestigiadas expressões já feitas pela humanidade.
Por certo, isso não é apenas uma opinião minha, é uma unanimidade: Asterios Polyp é uma das melhores hqs de todos os tempos. E, enquanto obra-prima, foi uma perda tremenda a graphic novel ter ficado fora de catálogo por tanto tempo. Felizmente, no fim desse 2022, a Companhia das Letras decidiu realizar uma segunda reimpressão de Asterios Polyp e você já pode encontrá-lo facilmente na Amazon ou onde preferir. Confere lá.
[PLAQUETE] PANINOS ETERNOS - FERNANDA SPINELLI
Vocês já devem ter percebido que eu sou zineiro: consumidor, produtor, admirador, há anos me sinto próximo desse gênero/formato no qual a liberdade - literária, fotográfica, editorial, artística - e o livre exercício artístico parecem tão fortuitos quanto vanguardistas.
A plaquete, que parece ter voltado a voga nos últimos anos no meio independente, seria algo como a versão de luxo de um zine: traz em si a liberdade de formato, cores, linguagens, mas pode ser registrada assim como outras publicações “oficiais”.
Com todo esse requinte, é perceptível como os zines e as plaquetes estão mais próximos de outras formas de arte, como, por exemplo, das artes plásticas, do que da literatura no grande espectro das artes da palavra. E se me perdoarem a ousadia, poderia dizer até que os zines e as plaquetes são um formato-objeto que se irmanam, para além das artes plásticas, com a gastronomia: primeiro se come com os olhos, depois se saboreia com o paladar (sempre pronto a declamar palavras ou degustar sabores).
Nessa seara, a plaquete paninos eternos (2022), da escritora Fernanda Spinelli, parece ser um ótimo exemplo dessa excelente possibilidade artística que o formato permite.
Composto de 12 poemas bem escritos, extraídos do seu livro de estreia - Síntese de passageiro (2020), paninos eternos impressiona com sua materialidade: com um formato “pocket”, uma capa de material único, bem diagramado e costurado a mão, a plaquete exibe um acabamento raro no qual podemos ver todo o cuidado artístico que Spinelli tem com sua obra e nos submerge mansamente em sua poética.
Nessa perspectiva, paninos cumpre perfeitamente seu papel de plaquete/obra gastronômica. Como uma bela entrada, brinda nosso paladar e nos deixa com vontade de quero mais. Sem dúvidas, é algo que vale a pena conferir.
Aos interessados, podem entrar em contato com a autora pelo seu instagram.
[NEWSLETTER] MATRYOSHKALETTER - LAURA REDFERN NAVARRO
Se a MAGAZINE existe enquanto newsletter, em alguma medida, isso se deve ao projeto da minha amiga Laura com a sua Matryoshkaletter.
Projeto que já está em seu terceiro ano e na 80ª edição, o projeto tem um formato no qual me inspirei para criar minha própria newsletter: há resenhas (assim como a MAGAZINE), produções poéticas (enquanto na MAGAZINE há produções estatísticas), recomendações e outras indicações (esse é autoexplicativo), um interessantíssimo diário de produção no qual a autora faz notas, reflexões e considerações sobre a sua própria produção (algo semelhante as "atualizações" da MAGAZINE, mas com uma introspecção e sensibilidade bem maior e melhor que a minha, confesso com toda admiração) e, além disso, (algo que não existe na MAGAZINE) uma divulgação atenta da cena literária vivida e vista por Navarro. Algo que só é possível pelo preciso olhar que a jornalista Laura Redfern Navarro conseguiria passar aos seus leitores.
Pois tenho a felicidade de dizer que a Laura, que tinha recentemente posto a Matryoshkaletter em um hiato, decidiu - imagino que eu tenha algum mérito nisso - voltar em grande estilo, agora na Substack.
Esse retorno, efetivamente, se relaciona a outra boa notícia que é a divulgação de seu novo projeto: a publicação do zine e livro O corpo de Laura, previstos para serem lançados já em 2023.
Como leitor privilegiado, *cof, cof*, é indubitável dizer que eles voltarão a aparecer por aqui em algum momento. Mas se você já quer ter um gostinho dessa poética, acesse e se inscreva na newsletter da Laura, basta acessar esse link.
Um forte abraço,