I
Começa calma.
Saio de casa sem muita pressa e me encontro com um taxista vidente. Ipatinga? me pergunta. Juiz de Fora, respondo.
Antônio não é um bom vidente.
A conversa rende o quanto uma conversa com um completo estranho é possível de render: entre o futebol, o trânsito e as diferenças entre mineiros e cariocas, falamos de roubos pouco antes de vermos um jovem ser enquadrado perto do meu destino final.
Talvez fosse Antônio um bom vidente afinal.
Na rodoviária, um jovem fuma distraído enquanto o sono do Dramin começa seu trabalho.
Embarco. Durmo. Acordo. Como. Espero. Leio. Espero.
II
(sempre) Fui calado
De onde venho não se fala
Se chora ou grita
III
Mentiras vãs de ambas as partes.
O teto é alto e a luz diáfana.
- Amo essas paredes. Elas conservam a anacronia da automutilação urbana e, de forma quase sinestésica, trazem à boca o ansiado sabor de se sentir adulto.
- Você me ama?
- Sim.
- Por quê?
-
IV
Sou uma alma local. Apesar de reconhecer o universo como grande, caibo em miudezas. Leio épicos, escrevo zines.
V
Volto à praia.
Minha bermuda, inapropriada para o banho marítimo, pesa contra a areia fina. Mas o peso atroz que, sem ser percebido, se acumulava nos sulcos da minha carne (como as estrelas que se acumulam em cada grão de areia) se esvai lentamente.
Quarta-feira. 9 horas.
A complicada dialética de nomes alemães e franceses se cala, o estoico silêncio do sol matutino sorri.
Me desencontro.
Bendita seja a catarse.